28 outubro, 2008

clínica ressurreição

Inflamada por vozes metálicas - difusas, neo-concretas e descontroladas -, Mulher-Balão sobrevoa chão fantasia; cerca de 1m acima dele nota-se cavidade nas solas cegas, mantendo diferença em relação aos gracejos do hélio, escorregando equilíbrio necessário para abrir a porta.
Num voo transversal, mariposas negras acompanham a história da Visita. Mulher-Balão ordena busca incessante por luz, num lustre de canto, lúgubre. Talvez por medo, Visita não encara o rosto da levitação: a recente supressão de adversidades bipolarizou o receio das mãos, tremulantes. Só bruxuleios do limpo encontro de subconsciências permite beijo manual - agradecimento pelo almoço orkuticida dum perfil de novembro -, sem crise, seus dedos, inesperadamente vivos, versejam confraternização requerida ao momento.
Bruscamente, vento uiva e porta fecha-se. Choro de crianças é frequenciado num ritmo meio UTI meio Igreja Universal. Corcunda, Mulher-Balão conduz Visita pros trilhos magnéticos dum tipo de trem-fantasma. A escuridão do casarão vai ganhando tons de luminosidade séc. XIX e superfície de portas e paredes lembra um verde cirúrgico The Dope Show. Marilyn Manson sai do quarto 1 e tranca 7 segredos da porta de entrada:

- Silêncio, crianças... Vocês que reintroduziram propagação de lágrimas psicodélicas?

Dentro do quarto 1 Visita vê bebê choroso e loiro. Recém saído de quadro da meia-noite e/ou do cemitério maldito ele chupa pirulito subliminar de lótus:

- É que a bruxa do 71 soltou de novo o Satanás.

Marilyn Manson ajeita seios postiços e retruca:

- Vai nanar com os demais, a Visita precisa despertar infância.

Uma tecno-enfermeira moribunda e também loura recoloca o bebê no berço coletivo. Inexorável, Mulher-Balão reoculta-se no capuz negro e reameaça algo com foice de plástico. Trenzinho volta a flutuar, quarto 2: música clássica, talvez Mozart, paredes de azulejo branco e denso vapor aromatizado por ervas sagradas, boldo risonho e/ou arruda indica. Trata-se de verdadeira sauna anos 1950; sob assentos, também de azulejo, a única iluminação de lanterninhas azul-esverdeado-água climatiza decadência da luxúria em dois corpos que esfregam-se com delírio purgatorial, sobre os assentos. Suor do gozo ganha vida na forma de mini-cintilâncias híbrido-cordadas, flutuando na grandiosidade da corrente de vapor. Mulher-Balão suga um sereno cardume dourado com seringa, amarra torniquete no braço da Visita e injeta-lhe doutorado em transcendência afogada. Visita fecha olhos e lambe beiços, como se estivesse instantaneamente grávida da anarco-cosmopolita liberdade-lírica. Atenção: a gota de saliva mal cai do canto de seus lábios e Mulher-Balão aproveita para lubrificar seus vamps dentes-de-borracha. Blecaute: Quarto 3: Medusa na Medula:

- Eu petrifico quem fala comigo mas olha pra outra pessoa que não sabe da presença dos favônios por fio terra, da felicidade...
- Seus olhos estão rentes ao chão? - entoa Mulher-Balão.
- Confira você mesma.

Serpentes enroscam-se até canelas da aparição, na apoteose de veneno amigo. São Jorge corta brisa do encontro e, com a lança - dotada de variados barulhinhos de sirene - faz o mesmo com a cabeça da influência viscosa (movimentos da Visita continuam respeitando o ar). Água negra que escorre do teto do aposento de repente transforma-se em tulipas, tulipas negras.
Ainda repletos pelo teor simbólico da sublevação, ronronando feito sub-silêncio maquinário, os três saem do aposento, reembarcam no trenzinho suspenso, e depois param em frente ao elevador de osso.

- Forçoso se faz o ciclo.

São Jorge despede-se com doce de igreja menor que ele: Visita agradece, abocanha carboidratos proféticos e digere mais um adeus. Abrem-se portas da cortina de ossada. Com fundo rock n' roll, cachimbo suspeito na boca, cálice de bílis esverdeada na mão, Amy CrackHouse aperta botão -2:

- Preparados pro reality-show convalescença?

Feito escoliose aguda, só depois de piruetas, costelas repartem-se novamente, Amy CrackHouse ajeita sutiã e deseja:

- Boa sorte.

Na verdade, trata-se de gran estacionamento até o muro das lamentações, do outro lado o Paraíso - diz Mulher-Balão. Como corrente humana, cavaleiros do zodíaco enfileiram-se até um crucifixo feito de computadores, pregado no muro. No teto, globo da morte, nevoeiro de espelhos e chuva de caracteres digitais, tornando-se densos o suficiente pra dificultar a visão do rosto do crucificado.
Notando regravitação da trilha, Ikki de Fênix dissipa dúvidas:

- Sacrifício é aqui, ressurreição do outro lado.

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