27/05/2008

blade runner

Uma vez disseram tratar-se do Matrix anos 1980: toda uma juventude viu seus pensamentos refletirem sobre o significado da vida, e do mundo - já globalizado.

Na previsão - de Do Androids Dream of Electric Sheep?, de 1966 - já estavam presentes mais do que palpites sobre a clonagem humana, a superação da criatura sobre o criador, o medo da morte, o comércio de emoções, memórias, missões... Enfim, esses fãs decolaram a fascinação de suas suspeitas filosóficas e religiosas na nave Blade Runner e nunca mais voltaram pra dizer o porquê da idolatração por esse filme.
Já conversei com muita gente que diz ter sido esse o melhor filme já feito até hoje - tornou-se um clássico cult e um dos primeiros da história a ser convertido e lançado em DVD. Também foi indicado ao oscar nas categorias de melhor direção de arte e melhores efeitos visuais.

É muito claro que ele faz comercial de refrigerante, cigarro (é difícil uma cena sem fumaça), cerveja, e a moda cyber-punk.

Somos tão brutos que até mesmo um andróide teria mais sentimentos do que nós? Somos nós mesmos andróides com toda uma vida pré-programada? Essas questões seduzem durante todo o filme, arriscaria dizer que mesmo em um futuro negro, ele tem um ritmo poético, há uma certa leveza em cenas mais lentas que contrastam com uma violência que não deixa de ter seu encanto, as tensões humanas ganharam ótimos e elegantes intérpretes; ora visceralmente artificiais, ora despretensiosamente de corpo e alma, eles criaram um incrível diálogo na mágica ligação personagem-espectador, vide as cenas de morte: são divinamente impactantes, o momento é refutado até o fim, numa delas a replicante se estrebucha e se conduz a um desesperado automatismo do corpo, em desacordo intenso ao seu fim. Numa outra, em câmera lenta, o momento derradeiro é retratado com uma trilha de batimentos cardíacos ao fundo e a sujeita vai levando tiros e quebrando vidros sem nunca pensar em desistir da vida, até que ela seja 100% inviável: cessam os batimentos cardíacos - um dos momentos altos do filme. Às vezes também acontece o belo efeito vampiresco de chama interior no olhar dos andróides (através de um raio infra-vermelho, Deckard usa um aparelho conhecido como Voight-Kampff Test que os detecta pelas oscilações da pupila e dilatações involuntárias da íris).

No começo há um olho azul, talvez o olho de Roy Batty, que reflete, de fato, chamas cuspidas no céu de talvez algum lixão da Los Angeles de 2019. Com uma névoa de poluição sufocante, raramente vemos a luz do dia, a cidade é vista por cima, de vez um quando passa um carro voador da polícia. Aos poucos somos cunduzidos à semi-pirâmide sede da Tyrell Corporation - responsável pela fabricação dos replicantes modelo Nexus-6, fisicamente idênticos aos humanos, porém mais fortes e ágeis (vide a excelente cena do golpe pernas-de-tesoura-sufocantes de Pris). O que acontece é que andróides que trabalhavam na colonização espacial acabaram armando uma conflagração e vieram ao planeta Terra, à procura de seu criador, para poder obter mais tempo de vida (eles são ativados para a contribuição de cerca de 4 anos).

Então um ex-blade runner, Deckard, é procurado para "retirar" (matar) os andróides rebeldes.
Mas ele vai à casa do criador dos seres mais humanos que os humanos e acaba encontrando a replicante de estimação Rachael. O caçador e a caça acabam se ligando emocionalmente, ela tem inteligência rápida e sentimentos de apego: mostra fotos de sua infância para provar que suas memórias não são um implante, todavia Deckard acaba atestando-lhe que são apenas cópias da sobrinha do dono dela, logo ele se arrepende: Rachael começa a chorar como uma criança desiludida. Ele vai beber um uísque básico, a mina toca piano em frente às fotos dos fantasmas de seu caçador, e dá-se início ao famoso love-theme do Vangelis, trilha que marcou profundamente o filme, os atores da trama Rabo no Fogo da TV Pirata, e uma geração inteira de broken-hearteds [até esses tempos tocou num atual seriado pastelão reacionário como clima do reencontro de um antigo casal de lésbicas (Rosa Maria Murtinho e Norma Bengell, huahuahuahuahua...)].

Rachael solta os cabelos, talvez para ficar parecida com a mãe de Deckard. Ele tira a camisa, e tenta ensinar a replicante a como deixá-lo excitado: diga "put your arms around me", agora "I want you". Ela acaba perguntando se ele já usou a maquina-pega-andróide com ele mesmo, dando início às suas perturbações existenciais.

É um filme bonito mesmo, embora eu ainda não entenda direito o porquê da figura do unicórnio, inclusive em um origami: Deckard olha-o e pensa em alguma verdade universal importante pra ele. Apenas sabe-se que, além do significado de virgindade e reencarnação, esse animal mitológico propicia sonhos para ajudá-lo a lembrar de algo que o levará a descobrir o paradeiro de Zhora - a respeito dessa cena, mais tarde o diretor confirmaria algo que já se deduzia da versão original, e eu espero que não vejam tal declaração, para que possam descobrir por si mesmos. Talvez possa ajudar o fato de, junto com a figura do dragão, o unicórnio aparecer em MEMÓRIAS DE IDHÚN: através dessa saga fantástica acaba-se descobrindo coisas muy pertinentes e relevantes para melhor compreensão do filme.

Existem duas versões: na do diretor não há a cena final da do original, que eu acho menos non-sense do que muita gente. A magnífica cena "Tears in Rain" não foi mexida, mas a película da versão atual é mais límpida. Metafisicamente ainda atual, embora não tenha chegado tão longe quanto Neuromancer - livro de William Gibson que inspirou a luta contra o domínio das máquinas de 1999 -, vale a pena conferir não só o romantismo de Blade Runner, inclusive no conflito polícia-ladrão, combinação ainda não ultrapassada por outra ficção-científica.


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Um comentário:

Anônimo disse...

Ficou Genial!
de verdade! a melhor resenha q eu já li...

Provavelemnte diz tudo que eu sempre quero dizer as pessoas sobre poruqe eu gosto tanto do filme! MAs nunca consigo achar as palavrascertas como vc!