30 maio, 2008

céu suspeito



Pode me ver? Pode me ouvir?
Imitando ecos defensivos
Outro de mim
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Um olho muy furado e outro
Fundo dum brilho igual ao meu
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Põe teus antolhos anônimos
Ultra-pai Ultra-mãe
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1 (um) número cabisbaixo
outro coração
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Vago demais pra caber em um alívio só
Adivinhação febril do meu você
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céu verdadeiro
Outro silêncio
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da luz
imitação de casa
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sonho azul
nevoeiro de cinzas
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linguagem bege


Aula de poesia contemporânea: cada aluno deve trazer poesias que admire, de 1960 pra cá. Não pensei duas vezes quando levei "Pintura expressionista", poema que dá uma breve idéia de sua proposta e parece ser resposta a poemas que uma vez lhe enviei. Estavam no páreo Adélia Prado, Orides Fontela, Caio Meira, Paulo Ferraz, Claudia Roquette-Pinto...
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Minha poeta foi a primeira a ser analisada. Érica Zíngano deu a partida, dizendo-se não convencida. Começo a ficar nervoso, replico-lhe que minha escolhida não utiliza violência branca, e sim linguagem branca. Érica publicou poemas na revista ZUNÁI onde não só usa, mas menciona uma violência silenciosa do mundo. Me explico: a linguagem de minha ré lembra-me uma pureza descontextualizadamente diurna/ teologicamente cuidadosa/positiva-racional, diferente dos processos de sucinta secura sexy da Érica (também gosto...) - que, contrariada, recomendou-me um filme onde o paraíso na terra é todo branco, inclusive em prateleiras e produtos de supermercado, e não deu-se por vencida. Assim, para o meu azar, os demais entraram no embalo. Andréa Catrópa, ministrante do curso, disse que cada poema deve refletir uma vida inteira, um mundo, às vezes isso resulta em prosa poética, o que eu admiro e encontro em seus poemas, de uma temática, linguagem e posicionamento diferentes dos de Beatriz Bajo. Tendo seu blog sido lido por ela, que disse ter visto em Beatriz a postura da geração marginal na forma direta de lidar com o leitor, eu concordo se isso significa o poeta que, completo, se coloca na vida. Porém, meio escandalizada, Andréa ainda disse ser masoquista as combinações da palavra "esquartejada" e a frase "tirar-me toda a pele" no corpo do poema.
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Será que há uma linha moral vigente nas atuais diretrizes da crítica brasileira? Se formos entender a poesia ao pé da letra, não só Beatriz, mas uma grande leva de bons poetas estarão promovendo um holocausto... Poetas são apenas serial killers, malucos, bebês chorões, frustrados, vampiros? Uma psicóloga, colocada, entrou na onda, mas foi só eu prestar atenção em sua análise para que seu tom clínico fosse metamorfoseando a um discreto elogio, à revelia, desistindo da idéia de deitar minha poeta em seu divã. Victor Del Franco disse que minha admiração poderia estar equivocada. Os demais alunos limitaram-se a vagos palpites, talvez sufocados pela opinião geral.
Onde eu fui parar?
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Talvez rindo de tudo isso, com uma voz elevada e decidida, sem acentos extra-dramáticos, minha "esquartejada" guarda suas armas brancas para um rubro desmazelo sobre o leitor. Não há preocupações e impressões demasiado exteriores e/ou contextuais na poeta do amor. É a essência X forma, o conteúdo X o vaso.
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Meus colegas certamente perderam a chance de descobrir seu sentido mais completo em poemas como "Sempre estivemos", "Tac táctil", "Que Truque!", "Água guardada" - os quais confirmam que ela não está de brincadeira.
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Beatriz nasceu com o fêmur deslocado da bacia e usou um aparelho que dificultava sua locomoção em boa parte de infância, o que a estimulou a começar a escrever trovas, letras de música e textos dramáticos já com 9 anos de idade, passando o tempo que impossibilitava maiores movimentos do corpo. Nasceu em São Paulo, tendo se mudado ainda criança pro Rio de Janeiro (seu sotaque é carioca, hehehe...), onde graduou-se em letras pela UERJ. Atualmente é aluna especial em mestrado na UEL e professora; contribui em diversas revistas eletrônicas como poeta, resenhista e contista, tendo sido vice-ganhadora de concurso para antologia poética muy respeitável. Ela diz ter sido fundamental para sua formação o filme Sociedade dos Poetas Mortos e uma oficina de poesia que fez, ministrada por Marcelino Freire.
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Conforme os poemas que publica em seu blog pelo pseudônimo de Linda Graal, depreende-se que o sujeito de seus devaneios não posiciona-se como vítima: têm-se a impressão de algo sublime, livre, nem urbano nem rural. Soltos encadeamentos de pulsantes e transbordantes imagens sobrepujam uma tímida biografia. A transcendência é ponto de partida dos primeiros versos de sua personalidade, e não o objetivo final; assim não nos é permitido verificar a ossatura de seu lado B enquanto ela vai escolhendo as palavras que veste e dá vida, processo que geralmente acontece nos poemas que dão mais valor à experiência.
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Sua linguagem não é bem branca, diria que é bege, mistura de pele, areia; desmaio de uma maturidade serena; equilíbrio, independência, elegância e controle emocional; crepúsculo espargido sob as franjas de um horizonte-possibilidade de nacaradas conclusões. Não somos agredidos pelas "educadoras" e às vezes brochantes imagens atuais. Sendo assim, suas palavras agradam, sua fina superação poética esboça alusiva resposta (sem sair de seu mundo pessoal) à profusão de vanguardas e grupinhos contemporâneos em "Ave mocinha" e também no abraço final de todos poemas, fardo encarado como exclusivamente íntimo em seu modo de conversar com um interlocutor sempre presente, ora recebendo parte do "mal-estar" da atualidade, ora distante - porém compreensível em suas ansiedades:
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"Enroladinha
preparo-me um cativeiro
gaiolas de goelas
de engasgados amantes
querendo seio beijo bico"
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Não sendo permitido oprimir a bem-resolvida visão do veni vidi vici - sensação que acompanha a fisionomia dos valores de seu EU lírico - a impressão que temos da maneira da poeta encarar a vida não diria que é marginal, mas sim à margem da relação com o outro: verdadeiro mote de sua triunfante e planadora pesquisa.
Atuais poetas poderiam julgá-la de alienada, inatingível. Todavia seus objetivos não são didáticos, sua delicada e inovadora verve que "come borboletas" passa a impressão de estar em um nível onde o intuito das coisas que a cercam não representa novidade:
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"Assim que se deitou
Sobre meu pé tão delicadamente
Trouxe-me algo de fenda
Algo de talho, latente
Entre os batentes da minha janela
Adentrando pelos basculantes
Roendo as sementes"
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Exatamente por isso, arrisco dizer que Beatriz é uma poeta que vai "ficar", esperta o bastante para desconfiar de duvidosas preocupações por uma poesia mais popular e inteligível aos grandes meios, às vezes sem a alma de suas formas abertas, contrastando com uma lógica mais sentimental e restrita, à espera do devido reconhecimento, que não tardará em chegar.
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Feminina, despretensiosa, inebriante e cristalina, sempre trilhando o caminho da simplicidade, sua criativa metafísica é ligada por abundantes conjunções, único e aparente lugar a uma dura realidade que não a encanta. Cada vez mais despedindo-se de ingenuidades decorativas e/ou discursivas, seu verdadeiro diferencial é mais baseado no arranjo de sobreposições imagéticas do que em indefinidas aventuras sintáticas:
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"é alma
a febre de corpo
temor de esquecimento
é alma - junto com a tua -
o vôo cai em delírio
@laúde como abraço
leve - em lava - alma
a deslembrança é o corpo a mentir a febre"
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Inquestionável, o que se vê como obra incompleta e ambulante é vista de cima, sem que se perceba, por olhos distantes e críticos, não se esforçando em convencionar um encontro de verdades. Como possível amigo que, inviável o contato, se prende em palavras de impacto, o amante e o amado recebem mais e mais confissões do desterro poético que, recuando, meio bruxo (no bom sentido), não faz nada para recuperar e/ou repetir um tempo, um caso perdido.
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Sem performática concatenação entre poemas semi-livres, porém sempre com começo, meio e fim bem urdidos - de singulares e às vezes estreitas aliterações e assonâncias; fluidos concretos em rima; atos funil - sua mensagem, romântica, crê na forma estabelecida no sentido da criatividade interior, sendo salva pelo que lhe falta e irritando quem espera algum poema denúncia ou lamúria por demais óbvia.
Aindo digo que trata-se de algo terapêutico, que faz bem mesmo, é uma leitura agradável e muy pessoal, um brando roubo de fôlego: verdadeira meta do poeta lírico, há muito tempo esquecida.

27 maio, 2008

blade runner

Uma vez disseram tratar-se do Matrix anos 1980: toda uma juventude viu seus pensamentos refletirem sobre o significado da vida, e do mundo - já globalizado.

Na previsão - de Do Androids Dream of Electric Sheep?, de 1966 - já estavam presentes mais do que palpites sobre a clonagem humana, a superação da criatura sobre o criador, o medo da morte, o comércio de emoções, memórias, missões... Enfim, esses fãs decolaram a fascinação de suas suspeitas filosóficas e religiosas na nave Blade Runner e nunca mais voltaram pra dizer o porquê da idolatração por esse filme.
Já conversei com muita gente que diz ter sido esse o melhor filme já feito até hoje - tornou-se um clássico cult e um dos primeiros da história a ser convertido e lançado em DVD. Também foi indicado ao oscar nas categorias de melhor direção de arte e melhores efeitos visuais.

É muito claro que ele faz comercial de refrigerante, cigarro (é difícil uma cena sem fumaça), cerveja, e a moda cyber-punk.

Somos tão brutos que até mesmo um andróide teria mais sentimentos do que nós? Somos nós mesmos andróides com toda uma vida pré-programada? Essas questões seduzem durante todo o filme, arriscaria dizer que mesmo em um futuro negro, ele tem um ritmo poético, há uma certa leveza em cenas mais lentas que contrastam com uma violência que não deixa de ter seu encanto, as tensões humanas ganharam ótimos e elegantes intérpretes; ora visceralmente artificiais, ora despretensiosamente de corpo e alma, eles criaram um incrível diálogo na mágica ligação personagem-espectador, vide as cenas de morte: são divinamente impactantes, o momento é refutado até o fim, numa delas a replicante se estrebucha e se conduz a um desesperado automatismo do corpo, em desacordo intenso ao seu fim. Numa outra, em câmera lenta, o momento derradeiro é retratado com uma trilha de batimentos cardíacos ao fundo e a sujeita vai levando tiros e quebrando vidros sem nunca pensar em desistir da vida, até que ela seja 100% inviável: cessam os batimentos cardíacos - um dos momentos altos do filme. Às vezes também acontece o belo efeito vampiresco de chama interior no olhar dos andróides (através de um raio infra-vermelho, Deckard usa um aparelho conhecido como Voight-Kampff Test que os detecta pelas oscilações da pupila e dilatações involuntárias da íris).

No começo há um olho azul, talvez o olho de Roy Batty, que reflete, de fato, chamas cuspidas no céu de talvez algum lixão da Los Angeles de 2019. Com uma névoa de poluição sufocante, raramente vemos a luz do dia, a cidade é vista por cima, de vez um quando passa um carro voador da polícia. Aos poucos somos cunduzidos à semi-pirâmide sede da Tyrell Corporation - responsável pela fabricação dos replicantes modelo Nexus-6, fisicamente idênticos aos humanos, porém mais fortes e ágeis (vide a excelente cena do golpe pernas-de-tesoura-sufocantes de Pris). O que acontece é que andróides que trabalhavam na colonização espacial acabaram armando uma conflagração e vieram ao planeta Terra, à procura de seu criador, para poder obter mais tempo de vida (eles são ativados para a contribuição de cerca de 4 anos).

Então um ex-blade runner, Deckard, é procurado para "retirar" (matar) os andróides rebeldes.
Mas ele vai à casa do criador dos seres mais humanos que os humanos e acaba encontrando a replicante de estimação Rachael. O caçador e a caça acabam se ligando emocionalmente, ela tem inteligência rápida e sentimentos de apego: mostra fotos de sua infância para provar que suas memórias não são um implante, todavia Deckard acaba atestando-lhe que são apenas cópias da sobrinha do dono dela, logo ele se arrepende: Rachael começa a chorar como uma criança desiludida. Ele vai beber um uísque básico, a mina toca piano em frente às fotos dos fantasmas de seu caçador, e dá-se início ao famoso love-theme do Vangelis, trilha que marcou profundamente o filme, os atores da trama Rabo no Fogo da TV Pirata, e uma geração inteira de broken-hearteds [até esses tempos tocou num atual seriado pastelão reacionário como clima do reencontro de um antigo casal de lésbicas (Rosa Maria Murtinho e Norma Bengell, huahuahuahuahua...)].

Rachael solta os cabelos, talvez para ficar parecida com a mãe de Deckard. Ele tira a camisa, e tenta ensinar a replicante a como deixá-lo excitado: diga "put your arms around me", agora "I want you". Ela acaba perguntando se ele já usou a maquina-pega-andróide com ele mesmo, dando início às suas perturbações existenciais.

É um filme bonito mesmo, embora eu ainda não entenda direito o porquê da figura do unicórnio, inclusive em um origami: Deckard olha-o e pensa em alguma verdade universal importante pra ele. Apenas sabe-se que, além do significado de virgindade e reencarnação, esse animal mitológico propicia sonhos para ajudá-lo a lembrar de algo que o levará a descobrir o paradeiro de Zhora - a respeito dessa cena, mais tarde o diretor confirmaria algo que já se deduzia da versão original, e eu espero que não vejam tal declaração, para que possam descobrir por si mesmos. Talvez possa ajudar o fato de, junto com a figura do dragão, o unicórnio aparecer em MEMÓRIAS DE IDHÚN: através dessa saga fantástica acaba-se descobrindo coisas muy pertinentes e relevantes para melhor compreensão do filme.

Existem duas versões: na do diretor não há a cena final da do original, que eu acho menos non-sense do que muita gente. A magnífica cena "Tears in Rain" não foi mexida, mas a película da versão atual é mais límpida. Metafisicamente ainda atual, embora não tenha chegado tão longe quanto Neuromancer - livro de William Gibson que inspirou a luta contra o domínio das máquinas de 1999 -, vale a pena conferir não só o romantismo de Blade Runner, inclusive no conflito polícia-ladrão, combinação ainda não ultrapassada por outra ficção-científica.


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neo-elegias

Lost
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Não acredito nos meus pensamentos
:
Sonho reeditado
( à espera do sorriso
que não aconteceu
Escolho o caminho mais difícil
:
fuga e redemption
Até quando? Pra que tudo isso?

Enquanto tudo parece tranqüilo
:
o barulho do vento
e mais nada
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21 maio, 2008

vâmo?

3



Eu tenho um sonho
E nesse sonho eu tô acordado
Dizendo no teu ouvido
Que eu já ouvi estórias de fantasmas, dinossauros e ETs
Que eu já olhei nos olhos dos meus pais, das crianças e da TV
Por isso eu não sei de nada
Por isso eu não sou nada
Sozinho
Eu não sou um cara bom porque eu faço a coisa certa
Só tô dando voltas por aí

99% carregado
Perca o controle/ Não perca o controle
Perca o controle/ Não perca o controle
Perca o controle/ Não perca o controle
Perca o controle/ Não perca o controle
Eu não sou um cara ruim porque eu faço coisa errada
Só tô dando voltas por aí

Volcano boy
Perca o controle/ Não perca o controle
Perca o controle/ Não perca o controle
Perca o controle/ Não perca o controle
Perca o controle/ Não perca o controle

19 maio, 2008

fugitivo

“Fuga #2”
primeiros erros perfeitos perdidos
agenda oculta
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a estória foge, com os passarinhos
veloz viagem de vulto semi-anil
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livro e roupas
emprestados
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de domingo em sábado
Black Sabbath em abril

17 maio, 2008

estamira



"(...) Enfia o farol na buceta.
da puta-mãe de vocês.
no cu da puta vaca.
da tua mãe-esgoto.
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Sou eu aqui.
dormindo na rua.
saia verde camisa preta.
Todos precisam de mim".



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Semana de comemoração do dia mundial da saúde mental: algo assim marcou evento que me levou a chorar de novo pela dama do apocalipse.

Lançado em 2004, ano Xtranho, o documentário de Marcos Prado veio à luz junto com novas propostas de políticas públicas pra luta antimanicomial, e ganhou vários prêmios nacionais e internacionais.
Embora tenha sido visto pelo aspecto da "pobrologia" segundo crítica da revista que dizem ser "indispensável", o filme tem méritos inquestionáveis para tapear não só a cara do público não-marxista e psicólogos mal resolvidos - em sua maioria realmente não muito a favor de trabalhos-denúncia.
Visões únicas de certo não dialogam com o critério pelo qual adesivam opiniões comerciais na hora de julgar um trabalho tão bonito.
O verdadeiro objetivo do filme vai além do simples relato das agruras dos menos favorecidos pela sociedade excludente dos espertos ao contrário...

Arbitrariedades nas quais a mente humana desculpa a dor estão na miséria, na loucura e na solidão, sem escolher classe social, e continuando à espreita de solução formato homem, positivo, par de seus anseios por justiça....
Arte não precisa redundar nas mesmas e velhas problemáticas para mostrar a beleza de uma senhora de 60 e poucos anos...

Catadora do aterro sanitário de Jardim Gramacho, Estamira, filha de astros positivos, passa seu tempo entre o lixo produzido pelo Rio de Janeiro ao som de canção de ar pentecostal dolorido, enquanto urubus disputam detritos sob forte ventania.
Ela começa seu dia-a-dia: sai do barraco toda limpinha pra trabalhar, percorre longa trilha de chão batido, pega o busão, veste suas roupas de serviço, mais à moda bicho, assim começando seu trampo.
Apresenta seus amigos, seus respectivos cachorros. Senta no seu mocó habitual, fuma um cigarrinho descansada, sorri, e começa a se apresentar.

Embora não pareça, ela toma cuidado com as palavras que diz: Augusto Boal se encantaria com os monólogos de sua sabedoria, de um raciocínio extravagante, capaz de levantar questões que mexem, que comovem o hipócrita escondido em cada um que se julga "normal" dentro de sua felicidade burra. Ou no mínimo Estamira desperta risos de nervosismo, como quando brinca com a seriedade do que diz, abre uma cervejinha, diz "cadê meu capeta?", a praguejar contra as pregações de seu filho evangélico...

Perdeu a mãe, filha de astros negativos, em um hospício... Casou-se com um homem que não tardou em maltratá-la na medida certa para que se revoltasse psicologicamente e fugisse do FBI. Mas uniu forças para não cair no mesmo destino da mãe, e debandou-se pro lixão, lugar onde encontrou mais chão para que suas idéias proféticas não se perdessem no ar infértil das atuais entidades brasileiras. É bem sabido que a vida em sociedade impõe duras condições a um espírito selvagem. Estamira escolheu a liberdade...

Alternando entre momentos preto e branco y coloridos, a fotografia do filme assume papel de resgatar o encanto das coisas baixas, ditas feias, inadequadas, chocantes. Mas o que mais vale a pena é o discurso de Estamira: segundo ela o atual mundo está totalmente perdido devido à violência das armas brancas dos trocadillos (trocadilhos: loucos diplomados) - que se aproveitam de status social mais prestigiado para transferir o peso de suas consciências em um mundo freudiano de chantagens e opressões emocionais (enquanto esquizoanálise ainda engatinha no Brasil). Ninguém mais é inocente, o verdadeiro salafrário atira pedra e esconde a mão. Existe o controle remoto superior - situado no além dos aléns - e o artificial, que controla seus nervos carnais através de fios elétricos, por onde os deuses cientistas controlam tudo para analisar o efeito de novos métodos, como se a coitada fosse uma cobaia... A única solução é botar fogo em tudo! Ou o comunismo...

Dá vontade de encontrar Estamira pessoalmente e abraçá-la, dizer que a entendemos, que pensamos em coisas parecidas, chorar no ombro dela, tocado por cenas como aquela em que percebe-se seu sofrimento pela filha que não mora consigo dizer ser falta de fé o problema da mãe.

Mas Estamira beija a foto da filha mais nova, recoloca a imagem num altar, e não desiste de seu sistema de códigos pessoal com o qual identifica o céu e tudo o que existe nele como simples reflexo da terra, e seu pensamento é um cometa, que sob denso efeito de psicotrópicos a deixa inoperante e sem inspiração para condenar os trocadillos, então ela fica nas mãos do controle remoto artificial, o que ela odeia. Falando ao telefone em uma língua misteriosa, manda Deus à merda, ao caralho, ao inferno. Abaixa seu vestido de domingo e mostra a buceta ao neto, dizendo: "ó, tua mãe nasceu daqui, não foi Deus que botou ela no mundo!".


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vâmo?


[Clique para ampliar]

Estarei me apresentando em conjunto, cantando com meu - Coral Acepuspiano, e solo, recitando alguns "Poemas flutuantes ou sei lá sobre o que eu tô escrevendo" - como eu mesmo.
Espero sua presença.

http://ciamesesdeteatro.blogspot.com/

revolta dos boitatás

Empresa pesquisada com razão social: uma associação de defesa dos porcos do estado de Centauro.
14 ANOS DE CONQUISTAS, EM DEFESA DOS PORCOS.

A criação da Jurema civil rights - Associação de Defesa dos Porcos do Estado de Centauro – foi articulada no início da década de 2090, em uma pequena confraternização entre amigos Porcos, que iriam concorrer a uma pocilga na Revolta dos Boitatás – Associação dos Porcos do Estado de Centauro. A magnífica idéia de criar uma entidade que lutasse e defendesse a Jurema já se passava pela cabeça do Cel. Silveirinho que, na época, ostentava a patente de tenente.

A idéia criou forças e, após uma série de reuniões fantasia, resolveram criar a entidade. No dia 25 de agosto de 2093 foi proposta e hidratada a criação da

Revolta dos Boitatás, que não só continuasse o espírito dessas reuniões, essencialmente de troca de guerras bacteriológicas em miniatura, mas que exercesse igualmente um papel ativo de representação dos Porcos junto ao governo e à comunidade sem-ar.

Todos sabiam que a luta seria árdua, pois por muitos anos o associativismo suíno foi considerado como subversivo e a participação de muquiranas a uma associação criava o estigma de indesejáveis, com o argumento de serem focos de perturbação no seio das árvores secas.

Naquele momento de fundação da entidade ainda existia o cloreto-byrônico daquela época. O início das atividades foi penoso e o combate pelo reconhecimento da associação como órgão legal de representação da categoria, imensamente difícil. As dificuldades e estripulias sofridas ressaltam o quanto estavam arraigadas na mentalidade de alguns que a criação de mais uma entidade era um mar e devia ser combatido até as últimas gotas. A insistência de seu fundador e atual presidente resultou em diversas transferências sofridas sem ouriços concretos. Além de todas essas dificuldades, seus fundadores ainda tiveram de enfrentar a fatalidade e a falta de eunucos. Os trabalhos da associação tiveram início em uma pequena sala pneumática de Centauro, na Vendaval Democrático, com poucos funcionários, apenas muita vontade e esforço.

Desde sua origem, a Revolta dos Boitatás sempre foi pioneira na luta jurídica dos interesses de seus detratores. Toda diretoria procurou formar, desde sua implantação, uma equipe de pocilgas altamente qualificadas para dar atendimento ágil e seguro, além de proporcionar satisfação total ao associado.
 
Cerca de dois anos mais tarde, em 2095, após muita luta e determinação, a Revolta dos Boitatás já transferia sua sede para o bairro da Bu, na qual se encontra até os dias atuais. Suas novas instalações proporcionaram aos associados melhores acomodações e serviços. Os investimentos realizados na área purgativa deixaram de ser apenas uma estratégia de marketing para tornarem-se a própria essência da marca Revolta dos Boitatás. O grande número de vitórias ajuizadas contra a Fazenda Púbica Estadual trouxe grande credibilidade à associação e proporcionou melhores condições aos regos beneficiados.

São cerca de 100 atendimentos mensais somente no Departamento Lugubrista, que está patrocinando diversas sacanagens.

Valores:
l Nossa xoxota deve refletir os mais altos padrões de ética.
l Nossa buceta deve ser clara e precisa.
l Nosso furúnculo deve ser em equipe, consistente e afocinhado.
l Nosso botequim com associados e colaboradores deve ser transbordante e baseado na responsabilidade do caralho a quatro entre as partes.
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as pessoas


LADO A
(vai achando que tá bom)
A crucificação é feita lentamente.
Sai da minha frente que eu quero passar
Sai da minha frente que eu quero me expressar
Acompanhe minha recuperação, não posso perder de vista seu R.E.M.#1 tremeluzindo:
Jeremias queria apenas ficar sozinho, escrevendo seus automatismos proféticos para seu blog, sem se preocupar com gramática e caligrafia. Espumava sua misantropia em paz,,, mas sempre tinha uma pessoa mal comida e mal resolvida o atormentando, cala a boca! Desde que ele descobriu, na oficina da metafísica das cadeiras, o símbolo das humanidades negativas,,, como essas coisas do mundo do teatro, ele espera seu ultra-leitor.
=}

Ele espera que a sala abra, mas as pessoas desfilam e rebolam suas imundícias desfocadas, e ele precisa limpar os poros de seu novo encontro respondendo em letra escrita. Ironias à parte, depois que fez a oficina da metafísica do dragão fez amizade com pessoas que não cuidavam nem cultivavam a forma como sopravam tagarelices de seus buracos, fisiológicos ou não. (Lágrimas brancas).

As pessoas estão em todo lugar, seus ouvidos, suas crenças, seus Corpus Christi free-style, seus movimentos bruscos, suas neuras, pendengas, solidões à dois, e mesquinharias.

Há dez anos atrás, antes de editar e concluir vidas alheias, virar mendigo e falar sozinho, Jeremias foi mordido por um cão raivoso, mas o médico não deu-lhe a injeção certa. Seu vago e vitorioso mistério de identidade escreve sem parar, é sua vacina para não enlouquecer de vez, quanto mais ele escreve mais ele se torna invisível. Sua teologia pessoal é algo muy intrigante: baseia-se em códigos de correspondência entre nomes de santos egípcios, africanos, católicos, gregos e celebridades atuais que se revezam em personalidades notórias na cultura, na sociedade, e na ciência do pensamento das massas... Atualmente as pessoas percebem que ele é um cara totalmente sozinho, mas sua classificação é certeira. O lirismo de sua vulgaridade bem sabe que quem não fala o que pensa é dominado por quem não tem medo de nada. A miséria humana tem muito estilo, mas ele ainda não parou de comer lixo da rua para manter-se vivo, atuante. Os oficineiros da metafísica do dragão fotografaram seus sentimentos e seus olhos desvirtuados reprocuram o livre arbítrio.

As pessoas o amam
As pessoas queriam ser ele
As pessoas que gostam dele só o massacram ainda mais,,, tentam lhe ajudar, lhe conhecer,,, mas ele sabe o que é de coração e o que é mafioso, sempre desconfiou das pessoas que não olham nos seus olhos de cavalo:

- Sai da minha frente
Que eu quero passar
Eu quero falar
Eu quero me expressar.

:O

Mas as pessoas não deixam,,,
seu coração espuma e suas narinas fumegam. Você sabe o que eu estou querendo dizer? Ele vai anotando tudo o que se passa, descobriu que é tudo impressões exteriores.... Quer transfigurar seus olhos, de castanhos em azuis, quer desesperadamente vingar-se dos espertos ao contrário,,, pois desde que tomou a enigmática vacina ele sonha acordado. A funcionária da sala da metafísica das cadeiras namora no telefone e não lhe dá coragem nenhuma para qualquer solicitação. A solidão é o parâmetro e o termômetro da conversa, o tom das risadas. Quando as pessoas se deixam guiar pela solidão todo momento bom tem seu condutor escondido, sempre que estão falando alto é porque alguém está sofrendo. A total solidão pode ser maravilhosa, ora essa, tudo pode dar certo.

Não é apenas uma questão de estar por baixo: ser uma testemunha dolorida de casos alheios não apenas pisoteia a vida de Jeremias como o torna um monstro, lentamente.
As pessoas sabem o que ele sente

Mas elas não fazem nada, apenas continuam olhando pra ele, à espera de um acidente
Porque nós somos todos iguais
Porque nós somos filhos de Deus

(Lágrimas cinzas)

relâmpagos lá fora: os santos se revezam, atualmente eles são políticos, esportistas...
Acham que os olhos de Jeremias são oração escondida. Alô? Tudo bem? Falam com ele enquanto olham para outra pessoa. Nem tudo nessa vida é linguagem visual mas infelizmente Jeremias a conhece muito bem. Quando a funcionária decide abrir a porta o evento já é registrado. Mas a elegância de pensamentos não se desfaz nem na fogueira dos piores momentos. Com seus passos arrastados Jeremias vai chegando, agulhas cutucam seu corpo - as pessoas vão chegando,,, lotando sua respiração. Ele tira uma garrafa de vinho da mochila, bebe, e bruxuleia a correnteza das faíscas do seu R.E.M. #2.

Quando eu estou passando
As pessoas gostam de conversar
Quando eu estou passando
As pessoas querem se conhecer
Começa fazendo a pose: uma careta concorda com o aprendizado, tudo ok?
O professor ainda "não chegou" de uma recente viagem...

As cadeiras estão dispostas em círculos, Jeremias precisa trazer o professor de volta para o Brasil em pensamento: ele deixa de contrair aquiescências, seus colegas o rejeitam, por enquanto só tagarelam, falam as mesmas merdas de sempre, o tom pejorativo de sempre.
As pessoas sentam, Jeremias se concentra, um em um milhão, bilhão, trilhão, não importa, ele não pode pagar pelo pecado dos outros, sua cruz ele mesmo constrói.
As pessoas só não contavam com uma coisa: Jeremias jamais desistiria de seus objetivos para viver a derrota alheia: nunca irá desistir de encontrar os verdadeiros sabotadores de sua consciência, sejam eles do ramo da medicina, do teatro ou do caralho a quatro.

Se a vida das pessoas não deu certo a culpa não é dele, e é assim e sempre será assim a maneira como as pessoas serão julgadas. Fazer os outros se sentirem errados não é tarefa fácil para qualquer um. As vagas para a metafísica das cadeiras estavam encerradas, mas Jeremias afiou as mãos e estalou os dedos, estudou escondido a metafísica dos balões, e hipnotizou o professor na fila da bilheteria de uma peça de teatro...

Sempre cabe mais um em espaços públicos, de graça até injeção na testa né?... Uma das peças para qual a oficina se destina irá fazer uma tour mundial de apresentação e passará pela Rússia, e ele quer desesperadamente ir pra esse país...

Cabeças pra trás: isso não é um registro, nem uma revolução pessoal, porque as pessoas continuam olhando pra ele. Quando na verdade ele está exposto por completo, na velha e mesma tentativa de conhecê-lo as pessoas acabam por conhecer a si mesmas... No albergue ficou sem ranguear,,, tomou sua cota diária de lixo, não decidiu o destino das crianças que morrem de frio, aqueceu-se em um paletó antigo, descoloriu a carapinha meio calva, tomou banho, perfumou-se com alfazema, colocou um brinco na orelha esquerda, catou baganas de cigarro para um happy-hour em frente à lan-house, jogou vôlei pela tarde, e lembrou-se de que era gente, só em aula ele consegue parar de atuar. Quando tudo estiver acabado relatará na internet sua última proeza.

Distenção de virilha: o professor já diz a respeito de sua insubordinação tardia, mais cedo ou mais tarde o baque será sentido, logo será suspenso, e Jeremias sempre será lembrado. Um primeiro tremeliquezinho se dá na cadeira do professor, Jeremias estala um calo do dedão direito, suas mãos estão firmes. Sintetizar pessoas não é nada fácil, elas batem pé no chão insistentemente como que para exteriorizar suas relutâncias em querer ir embora. Ele se refugia em pensamento até sua bunda de pagodeiro, projeta os joelhos pra frente, e é como um passo de balé que recupera seu canto direito, onde uma colega humilde e gostosa olha para o meio de suas pernas. Do outro lado uma coluna humana estica a corcunda, e ele reza para Nefertiti.
Cheiro de chuva lá de fora: as musas também se revezam, atualmente elas são cantoras, atrizes. Respiração: as pessoas fazem questão de fungar e tossir na cara de Jeremias, mas há uma coisa com a qual elas não contavam: nas aulas da metafísica do dragão ele aprendeu a segurar as exalações do castigo até a hora certa de ascendê-las, e não há remédio que torne saudável uma solitude predatória. Os parasitas são os meios,,, as fúrias são as portas, e a cólera das paredes é quem ordena:

- Eu vou embora.

Vai indo que eu já vou, reviravoltas incorporam tarde demais, Jeremias vê a fresta, nunca descartou essa possibilidade. Baixa a neblina quando as pessoas atropelam suas intenções sem querer-querendo, e o atropelado fala calmamente:

- Não é nada pessoal.

Quem mandou sugerir intimidade com quem não se conhece? Debaixo de sete peles também bate um coração, pelo que virá, e o que restou de uma missão subconsciente. Debaixo de um corpo fechado ainda pulsa a razão - e ela não aceita a desigualdade social de jeito nenhum, embora meio adormecida pela sazão de frutos virtuais.

Ponte: o sebo escorre da madrugada das paredes, em cada rachadura a luz perpassa um novo reflexo afogado em arrependimento:

- Desculpe por favor, desculpe.



.
LADO B (as alturas, deixe-as limpas)
Estamos conectados, meu amor...
Você ainda não sabe do que eu sou capaz...
Recuperar-me emocionalmente não significa que eu vá perdoar o que as pessoas fizeram comigo. Se você é feliz o problema não é meu...
Imaginem o seguinte: eu vou te prometer mundos e fundos, vou dar o beijo da sua vida, e quando eu der um tiro na sua cabeça e você já estiver morto eu vou dizer todo arrependido e condoído:

- Desculpe, eu não queria te matar.

Tudo em ordem?
Respiração ok?
Respirar nuvens...
O quão perto de mim
Um nevoerio de espelhos
pode respirar?

Só depois da metafísica dos répteis Jeremias soube que existem pessoas que não respiram...
Meus amigos, vocês estão respirando?

o_O

Não sei quem é mas já sei como paira certa aproximação acomodada, Jeremias sabe que não deseja mal a ninguém, apenas se defende dos espertos ao contrário, ele ainda tem um pouco de medo de atrair coisas ruins com o que escreve, mas todos os planos de descendência desde a queda de Atlântida fazem dele um bueiro de ultra-conhecimento, embora tenham lhe ensinado que tudo é ruim e tudo não presta. Na distração das asas a neblina sobre um palquinho murcho de gravidade não é suficiente para dar conta da inflação de um balão com cara de dragão. Não sei por qual motivo as pessoas tremem, não está frio, e as bolhas de sabão de seus desejos já está quase saindo de seus buracos, fisiológicos ou não. Todas as lembranças gordurentas apagam-se de novo, trovões lá fora:

As pessoas
Nascem
Brincam
Estudam
Trabalham
Casam
Procriam
Morrem

=/

Câmera lenta: crucifixo no peito, olhe nos meus olhos, agora você sabe que eu existo???
a espuma de sangue não faz Jeremias rosnar, nenhum truque de bruxaria é tão intenso quanto a fúria eterna de suas

Lágrimas Negras

sua vontade de falar a verdade. Jeremias apresenta seu número com "Parece que eu Morri", bendito é o fruto dos sentimentos de sua coreografia, a vida é assim mesmo, eterna em um segundo, revelada em um olhar. O desgraçado não dá nenhuma volta completa no palquinho em frente aos colegas. O professor desespera-se.

As pessoas são assim mesmo, é complicado.
Esse clima,,,
Essas vozes,,,
Esses vasos,,,


Antes da vacina ele não sabia o significado da palavra mágoa, Jeremias poderia ser o antídoto de cada encontro alheio mal feito. Mas a melhor maneira de conhecer as pessoas é expondo suas fraquezas e defeitos para ver como elas reagem. Existem tantas pessoas que eu tenho que conhecer
Tantos livros que eu tenho que ler
Tantas cabeças que eu tenho que ver
Existem várias pessoas que vale a pena conhecer...
Flores e passarinhos já operam na máxima potência
Num belo dia
Voltar pra casa está na moda
Mas vou viver esse sonho
Nesse mundo ou em um coma profundo
Tudo é possível

Palmas

Jeremias não sai de cena: investidas vulgares voltam do mesmo jeito que chegam de gargantas glicerinadas, recebo-te conforme sua aparência e despeço-me conforme seu conteúdo. Nomes escorrem das minhas costas, Jeremias pega a escova e enxuga o refluxo da minha espinha. Como um tiroteio de encantos as palavras atravessam tubos humanos caretas com o que restou do próprio ar de estranhamento, vigente desde o fim do século XX. Expio animação alheia. Voa voa amiguinho.
Jeremias nunca deixou de acreditar no valor da amizade.

Pelo coração passam os passarinhos, ternos fluxos, amigos não-assassinos, mães e pais da violência do amor. Os ossos pesam, os tubos humanos corcundam, qualquer descuido é mudança de maré na platéia, é onda de apnéia cedida.

Jeremias é bonzinho, sempre foi e sempre será, as pessoas também acham que ele é burro. Mas seus dedos já conhecem cada cadeira. A praça levanta e a fuga senta.

Abertura
Ventania lá fora:
Ponha-se na minha pele e tente sorrir
Ponha-se no meu lugar e tente se abrir
comigo
Tá vendo o que eu sinto?
O mundo mofa enquanto você caminha no ritmo da luz em sentido contrário.
Infelizmente

Só Jesus Cristo para perdoar

Não dá pra entender mais nada não é?
Que da hora isso né???
Que sensação bouwa né???
As pessoas te impedem de enxergar o horizonte???
Tudo é indiferença???

Entre as nuvens já não se enxerga, as pessoas suspendem seus sonhos,,, tudo é interferência,,, as pessoas tentam fazer de sua obra a recompensa que Deus não lhes deu...
Me dê asas meu Deus!

Amaldiçoe quem não reconhece seu filho. A cruz é erguida, desde 1968 ela andava abatida, quero ouvir a respiração das pessoas mas elas já estão completas pelas nuvens. O teto já totalmente rachado, portas fechadas dentro de suas casas?

Ah... sem gravidade, que coisa bouwa né?

Morte em vida: as pessoas disseminam o ódio, gritam, esperneiam, não aceitam a tempestade lá fora

:[

As nuvens estão maravilhosamente opacas, carregadas, as cadeiras dão piruetas no céu, lindo, divino, Jeremias abandona as pessoas, sai do centro cultural, não deixa que o tufão se misture às suas
Lágrimas de Sangue

e corre pra lan-house.

Se é da natureza humana errar a tal ponto eu não sei. Só sei que Jeremias é e sempre será o sacrifício, a verdade, e a sentença.
Se o amor se burocratizou eu não sei, só sei que as pessoas cegaram seus sentimentos em nome de um mundo de injustiças e incertezas.




 





16 maio, 2008

pop


não Faço com os ouTros o Que não FarIa a mIm mesmo

triste esponja
atrás, do meu pescoço
a raça humana, simpatiza comigo

não há sabão que faça mais bolhas, de gás hélio
um sorriso, que rasga a nuca
ploc ploc

quem é?

espuma elétrica
mastigo teu caminho
teu estômago, na ponta do meu chiclete

brilhante víscera sem luxo
engulo e disfarço
banana-split com perfume de seio

!

refrão: O que é isso?
O que está acontecendo?

14 maio, 2008

dante alighieri

Os macaquinhos brancos
saindo do Colégio
Dante Alighieri
Está morto

11 maio, 2008

inland empire

Não é pra entender.
Se os sentimentos estão alinhados a uma época que procura sentir o ilógico em relógios adiantados, o cineasta verdadeiro encanta o espectador que prefere brincar de se deixar levar ao invés de descobrir significados. Oculto na criança de cada amante da magnífica estética presidida na vida cotidiana de dramas, conflitos, perturbações emocionais e a bela forma que esses trecos tentam preservar, ele sobrevive.

Para avaliar a qualidade de uma obra em tempo de reality-shows e fábulas-alegóricas-não-condizentes à queda do império dos sonhos, é preciso ser um terrorista inconsciente, distante e isento de críticas revogadas ao que está mais baixo, mais indefesamente propenso a sacrificar-se em nome de ideais mais íntimos...
Nossas crianças assistem filmes sobre carros com vida própria, bruxos-mirins, e demais super-heróis que apagaram da memória o 11/9 e continuam lhes alimentando o sonho americano, através de personagens que resolvem transcender em sentido cerebral e vazio. Os pais nascidos nos anos 70/80 bem sabem que não há como se arrepender por terem visto um Kubrick inadequado pra de menor em madrugadas televisivas de pré-adolescências solitárias. Se a mensagem do ser humano passivo não continua fluindo em sensações só recuperáveis num #1 crush já balzaquiano, estaremos criando asnos com varinhas de condão não só em eventos de RPG e encontros cosplay.

Nazareno gosta de entender uma razão, uma moral na estória. Ele foi ver o filme pensando que se tratava de A Espiã. Até aí tudo bem: viu o começo e só por isso já o classificou como muito bom, uma coisa louca mesmo, legal... há toda uma preparação: primeiro a cena do projetor de cinema, na seqüência uma agulha toca o disco sob rápido jogo de luz e sombra; diálogos tipo walkie-talkie vão se estendendo em compassados barulhos de sinos abafados e a luz refletida no disco vai metamorfoseando-se num corredor de hotel, tudo em preto e branco. Porém a cena no qual um casal dirigi-se ao quarto não parece tão antiga como a do disco, embora continue no seu clima de filme-b: a mulher, desmemoriada, não sabia que tinha a chave para o quarto no qual ia entrar - primeiro significado chave do ultra-leitor do filme dentro do filme. O rapaz, suposto cliente ansioso pelo trabalho da jovem mulher, tenta conduzi-la. O rosto de ambos é encoberto por efeito de foco embaçado, impossibilitando-nos de identificá-los - primeira possível abstração do EU para uma "outra" personagem - enquanto a jovem aspirante pergunta O que devo fazer? Devo tirar as roupas agora?, ela deixa os seios suscitarem mais focos translúcidos e o homem tenta fazê-la recordar como caprichar nos também pouco perceptíveis movimentos de diáfano boquete, visto pela lente dos olhos dele. A "outra" personagem nos faz crer que é a moça do filme-b e estava fazendo teste com o diretor. O filme ganha cores, ela assiste, ofegante, uma TV fora do ar --está enrolada num lençol de cetim bordô, sentada na beira de uma cama forrada por adamascado cobertor verde, meio desarrumado, de um outro ou quem sabe o mesmo hotel da cena anterior--. O filme traz a primeira luminosidade diurna que vai potencializando-se, iridescente; à medida que uma bela trilha cantada em inglês (Polish Poem) atinge tons cristalinos e sublimes, a morena de traços eslavos chora, como que desiludida ou deixando a impressão de que é espectadora de um outro filme que está prestes a começar e ela já sabe o que irá acontecer: sua estória vai repetir-se com outra mulher que precisa libertá-la do peso de problema mal-resolvido do passado --que embarga a consciência dos bastidores de sua vida; logo a moça lamuriosa figura como personagem que "espera" salvação, solução iminente, de uma maneira tocante, incomum. Porém toda interpretação pode ser posta por água abaixo assim que vemos a próxima cena. No decorrer do filme, outras mulheres falam sobre acerto de contas, hipnotismo, assassinato com chave-de-fenda, previsões trágicas e outros diálogos vagos de diferentes idades, fases, tempos e lugares do EU antigo --estrangeiro, suspeito-- da personagem do filme "47". Uma vizinha grotesca adivinha que Nikki Grace, atriz hollywoodiana, deve interpretar o papel principal do filme sem saber que se trata de remake baseado num conto amaldiçoado de ciganos poloneses: o casal principal da primeira versão cinematográfica se apaixonou na vida real e foi assassinado, a mulher com a chave-de-fenda enfiada na região do fígado, do baço, por ali...

Então a moça lamuriosa abre passagem à TV com imagem de chuvisco: do outro lado do aparelho, como se a TV tivesse uma segunda tela na traseira, vista de cima uma família de coelhos contraria metabolismo e instinto, levando uma vida cotidiana doméstica pachorrenta: a coelha mãe sentada de frente à TV, num sofá centrado em espaçosa sala de pé direito alto e paredes verde-fraco-antigo; o ambiente parece valorizar o espaço entre os outros coelhos --o coelho pai que chega do trabalho e uma coelha camareira, mais "na dela", que passa roupa ao fundo, com movimentos lerdamente febris--. Primeiros diálogos entre roedores-sapiens são dignos de risadas por parte de uma platéia que situa-se fora do alcance de nossos olhos...

Depois que Nazareno viu que o dvd não era de A Espiã, ele caiu na gargalhada com a cena final do filme, mesmo efeito produzido pela cena em que Naomi Watts --filha de hippie-- tem um tremelique espasmódico quando tá assistindo aquela chicana com maquiagem bizarra e desenhos de lágrima negra borrados cantar Llorando --versão de Crying, by Roy Orbinson-- no clube Silencio, da antiga Cidade dos Sonhos de David Lynch; e sei lá o quê, talvez a emoção do playback faz a cantora desmaiar "do nada" no meio da música.

O cara não tem script certo. A coisa vai fluindo ao sabor dos personagens que avançam dentro de uma digressão com quase sempre finais felizes e românticos, porém centrípetos, tipo coming-back de ternura advindo de todos sentidos. Dispersões do EU ganham vida própria e convivem em harmonia, ao contrário de Clube da Luta.

A trilha-sonora é linda, além do próprio diretor com Ghost of Love, tem Beck, Nina Simone, White Rabbit - que um dia Jefferson Airplaine apresentou no festival de Woodstock. Dizem que é inesquecível trabalhar com David Lynch, um cara gente fina, espírita. No set de filmagens o clima é de apaziguamento e há tranqüilidade no avanço das gravações, embora o que aconteça em cena nos faça pensar de outra forma. Os atores, figurantes e funcionários se tratam com amizade pois o diretor tem firmeza no que propõe sem deixar de saber ouvir sugestões alheias, com razoabilidade nas decisões. Você é conduzido à sutileza vinda da tragédia, como o conselho das prostitutas que miram lanternas na cara de Nikki na casa cenográfica (onde ela reencontra o ilustre abajur laranja intenso): deve-se observar a vida através de um buraco de cigarro feito em fino tecido de seda rosa.

 






van gogh

- Você nunca vai paAraAaAaRrrhhh?...

Sirenes divinas ecoam na caixa surda da minha cabeça. Oh my God, oh my God, expensive justice for dear God! Não sei quem é mas já conheço, é como um soprão de ouvidos mesmo, me encontro em pleno Van Gogh perante este estertor de outros tempos, cavernosos.

- Não está vendo essas caras grotescas ao nosso redor?
.
Bafo seco da traição reivindica sensação de um sonho alhures. Não sou eu o menino que veste paletó? Não sou eu que exalo naftalina? Madama não tem tempo de respirar? Não vou desmoronar o charme desse caveirão, enternecido.

- Onde paramos mesmo?
- Ah,,, tu sabe... nAqueElaAas cooOisaAaAasss toOoOodaAahsss...

Aquelas grandes questões não respondidas pelo saxofone da Benflos, vidas mofadas em mesas mal iluminadas por candelabros suspensos. Bate-papo sem fim nem começo, paramos no coração da madama, e ela deixa reluzir uma ponta do depósito da alma. Me esforço para não olhar para os reflexos Bruce Lee, seria o grande espelho de moldura vetusta logo atrás fruto da uisqueria da minha imaginação? Juro ver aranhas refestelarem-se em sua aura grisalha.

- SOooOOooou artista plástica.
- Ah é? e eu apenas um cinéfilo das antigas.
- Mesmo?
- Yeah.
- Já viu o filme O Iluminado?
- Yeah.
- Sabia que o verdadeiro iluminado do filme era o gurizinho...?
- Ué, sempre achei que fosse o Jack Nicholson.
- AaAaAhhrrr... a juUveEntuUuUuUdeEhhhhh...

Tenho rigidez de movimentos necessária para galantear madama. Passarinhos piam dispersamente na Redenção. Um resquício de vida crepita no cadáver:

- Tu faz michê na J.B.,,, né?
- Não, sou técnico do amor.
- Para de fazer esses códigos com o espelho.

Calma, se o sorriso é científico, inesperadas paranormalidades surpreendem as mãos:

- Te quiero.

Cinismo aos poucos vai cedendo, tenuemente desvencilhando-se da caricatura do gato de Alice até recusa distorcida que envelhece momento num piscar de olhos. Madama retira as mãos frias do meu aconchego inocente para um gole de vinho, e olhos espiam pelo véu da noite, meio assustados, olhos desiludidos com o amor:

- Vai embora.
- Vamos juntos.

Imagine ficar assim, pra sempre nas vascas metálicas desse bar, falando sempre sobre aqueElaAaAsss coOoOisAaaasss... 
Madama esconde mãos no xale preto:

- Tá achando que me engana,,, é?

Quando cai os níveis de noradrelina e serotonina é sempre assim, nem mesmo a patricinha que entra no recinto ressuscita a graça daquela névoa viciosa, assim é a vida, assim é a noite, conversa brocha, quem vai embora primeiro? Mais vinho por favor. Não sou eu que faço festa em off? Esse quadrilátero encarquilhado sempre me cheirou à morte, bafo. Não olhe por cima da minha cabeça, tenho fôlego do fogo nos teus olhos, devolva-me as mãos.

- AAAaaaAAAAhhhhhHHhhHHhrrr...
- Eu pago a conta.

Estaria em coma meu amor? Ou suruba clandestina não gozaria a luz e a esperança do dia? O calor... As crianças no parque, camisinhas usadas, nosso júbilo abençoado por travecos, tartarugas, gambás e morcegos. Quando acordasse assombrada me encontraria do seu lado e, após um bom banho de chafariz, eu confortaria sua carranca descrispada no abraço do meu peito. Essa cara de gárgula amanhecida, ainda meio arisca e desconfiada da realidade:

- Ainda bem que foi com você...
- Comigo o quê?
- Que eu trepei na rua...

Todas faces fantasmagóricas podem confiar no meu abraço angelical; beijo do dia para o vaticínio final da boemia impregna não só as roupas, mas também o escárnio digno não-condizente ao rumor dos espectadores que apenas lamentam o triste fim dos lunáticos - na eterna promessa de outras festas, sob roupagem nova. 

Outros dias não é que eu passava pela esquina do bar (morava na República) e ela continuava ali? Às vezes entrava (de dia), pedia refri, lia Machado de Assis numa mesa com janela de frente à J.P., e ela naquele mesmo ar, blasé... envolta pela madeira escura que disfarça idades avançadas... fazendo que nem me conhecia, ali... No mesmo lugar... 
.
sozinha... 
.
pra sempre...

inconcordável mano novo (23/01/08)

Poesia: é tão estranho, ninguém pensa que eu sou ladrão no busão, tenho vontade de gritar e surtar de vez. Respiro fundo, faço sinal da cruz em frente ao cemitério da Consolação, as portas (automáticas) abrem, e uma senhora desce em paz, em outra parada.

Um nariz que sobe na Angélica me leva de esgüela até a Paulista, enquanto o nordestino que filma minha inspiração resolve se sentar em frente ao Masp (mas logo desce e fica atrás da minha nuca).
Texto: não quero ser comparado à Pitty, nem ao Aldous Huxley, nem ao gado, isso é coisa de gente chic. Chego no Paraíso, desço intenso, sinos dobram, e é jagunçoso meu jeito de atravessar a avenida. Depois do 1° café c/ leite é 0x0 com a atendente, fazia mó cota que eu perdia. Chego no Centro Cultural São Paulo, tia Rita é ambiente, dizem que sou louco, e o primeiro olhar altivo traz de volta o meu sufoco. Não queria falar sobre gente feia com dinheiro que acha que está num shopping center.

O faxineiro #1 usa o uniforme cinza e vermelho da prefeitura, masca chiclete e olha pra mim, mas os movimentos que faz com a boca não são putos, dizem tudo o que pode soar verdadeiro. O samba é triste, meu amor não veio, mas quando o morro descer minha tristeza não vai ter vez.
Coff coff, desculpe, é a natureza tuberculosa (diz o professor de poesia), mas a criança funga estrela, os coxinha passam reto, caralho, desculpe, é, tá embaçado, todo mundo percebe: vai trabalhar? Vai trabalhar? A voz chega tão conhecedora do meu ouvido e olha pra bunda de uma loira. Abaixo a cabeça, Caetano canta logo acima do céu ainda tropicalista, a ditadura do pensamento é chã, mas o poder da minha imaginação ainda é niilista.

É a minha vez, venha para a luz, queremos estender a carne no varal de arame farpado, mas que ela ainda pulse, ok? Trincô: um olhar nissei chega até a espinha, logo volta pro livro, de engenharia.
Trabalharia registrado se eu tivesse o certificado de reservista, mas como sou traidor da pátria só me resta ser artista.

Estou sempre sentado (disse a professora de teatro), sou um cara triste, não encontro amparo (?)... XD... não evoluo (disseram umas mina aê), professores, assistentes sociais, psicólogas, freiras, atendentes de boteco, operadores de telemarketing, entre outras mãos e vozes que cortam a respiração de quem não sabem que sangra em praça pública, e não tem descanso nunca (mais).

(Palmas)

Coff coff (risadas) coff coff.

Não dá pra aceitar, não posso ir, não posso rir, tenho vontade, mas não pago de sorrisinho. Tem traição que não se faz nem com inimigo.

Meu professor passa no momento em que eu ia brigar sentado, e o carrasco fica sussa, de canto e sossegado. Coff coff, a retribuição é em (quase) surdina, o carrasco #2 acha que é com ele e vira a praça pra direita (mas meus olhos já reservam todos os lados).
Limpo as lágrimas, o filme acaba, alunos e professores concordam com o fim. Não sou um esperto ao contrário.

Lá vou eu, me levanto, esbravejo o peito, tá na hora de bater meu rango (esmolado).

(Arrotos)

Tá na hora...
É nóix... Aqui Estamira ainda rosna:

- Vai tomá no cu
Vai pro inferno
Vai pro céu
Vai pro caralho!!!

festival de exumações microcósmicas

Mãos geladas em primeiro lugar (entram em alarma) assim que passo certificado de reservista (falsificado) à dona do cemitério. Coceira, coceira, coceira no pescoço, coceira nas veias: sou admitido, ossos do meu ofício podem contar com hipótese de um descanso tranqüilo, em paz. Fiz tipo um teste de DNA em todo o caminho do blunt of judah, e não me enganei. Minha intuição recebe uniforme, instruções e luvas de borracha amarela. Atestado médico, também falcatrua, com aval da própria empregadora, suave... Falo que sou poeta: enquanto acaricia meu rádio ela adocica a voz, e pede que eu mande minha arte por e-mail. Trabalho no calorão, eu e o túmulo, túmulo e eu. Em plena segunda-feira, secretamente, bebo um pouco de vinho: estopim de vômito friamente fracionado em 7 dias, 7 noites, 7 velas pretas, numa festinha subterrânea e particular de Baco - que recebe meu suor-fantasia, minhas lágrimas-atrizes, e meus sorrisos coadjuvantes. Pretendo encontrar a mim mesmo num festival de exumações microcósmicas, num revival de exorcismos voluntários. Minha vida passada me aguarda na ala da 2° guerra mundial. Todo corpo, todo corpo, expio meus encostos e crenças, mariposas negras na clavícula, stanislavskiamente acaloradas. Passado nos perfumes, vovó no esterno, minha taróloga no atlas, paixão na sexta, black sabbath na folga e ressurreição no domingo, perfeito. Se essa patroa não pegar muito no meu pé posso até pensar em ficar 6 meses pra depois me encostar no INSS como esquizofrênico. Botam tranqüilizantes demais nas bocas de rango, preciso ter meu esqueleto encantado custe o que custar.
No fim do expediente vou fazer meu happy-hour na taróloga: bebemos vinho, ela acende velas, fecha a tenda e, espantada, não acredita nas cartas boas que tira. Meu jejum agradece: último cigarro.

2° dia: Briga de mundo contra sub-mundo na ala da gripe espanhola, tento tranqüilizar inospidez desoladora e logo o barulho das crianças endiabradas, brincando, ameniza solidão. Sem ninguém por perto me encontro pela primeira vez: tiro a galinha do saco: minha terra mata a sede, acendo velas, me abandono. Os góticos estiveram aqui de madrugada pra fumar maconha e se esqueceram de limpar o local onde fizeram uma macumba inspirada em livro wicca: vou denunciar o sacrifício à patroa (leiga): a magia saxônica não deve ter nada a ver com a iorubá e, conforme falou-me na véspera, despachos já são costume da região.
Ela aproveita para dizer que viu muito de Baudelaire nos arremates da minha poesia. Encerramento: na taróloga mais paquera do que agouros, última punheta.

Tríplice esperança murmura, madura: estouro bolhas na mão mais afoita com a vassoura - ontem, no contorno das capelinhas decrépitas, provavelmente com folhas caídas há mais de um mês. Almoço manjar branco com cobertura de cinzas, a patroa pede que eu trabalhe de maneira mais rústica: embora meus olhos estejam encovados, conquisto seu coração. Ela vai embora. Dirijo-me ao berço, como a terra abençoada. Nenhuma suspeita cai na madrugada da omoplata. Pinto de cinza a ala das crianças: o céu chora seus mortos, anjos molhados de sangue. Penso em Mortícia, sou padrinho de Gabriel, seu filho. Fazíamos as melhores festas black metal de Viamão. Desde essa época uma bibliotecária, Morgana, 7° filha, alternava o foco do seu papo com uma plantinha - que tratava muy bem - pra conversar comigo enquanto catalogava certos destinos evasivos, que ironia... estava hipnotizado e tentava disfarçar quando ela conversava com a planta, mas sua aguda visão periférica perguntou-me por que eu ainda não tinha virado ator... Fim do trampo: componho Tentativa #1 no boteco de Margot, a portuguesa: último café c/ leite. Mais tarde na tenda sombria a taróloga se redime e diz que Jesus é a verdade, o caminho, e a salvação.

Quadratura de aquário com peixes: fogo-fátuo #2 diz que tem uma doença incurável, Você já está morta minha filha. Ela não aceita minha constatação e, relutante, se esperneia no chão, ficando invisível aos poucos, até desaparecer por completo... Vai prum centro espírita minha filha... Na assunção de voto remexo o sacro, no intervalo escrevo um poema sobre paralisia com falanges clandestinas, crânios vermelhos reverberantes e pés emocionados numa correnteza negra, fixa, e pura, arrastando possibilidades: Zumbi. Vozes femininas costuram reflexos debaixo do meu calcanhar: Estamira (ainda vocifera um colo surdo aos meus ouvidos sovados pela revanche das gralhas). Não vou na taróloga. Última mania de agradar quem me desconsidera. Em casa vejo Hair e componho Foguete Transanônimo.
Sexta-feira da Paixão: me acordo enxergando apenas vermelho, branco, e preto, aliás, acordo daydreaming num mundo afogado. A patroa tinha dito que quase não havia enterros mas quando chego no cemita tem um: não sabia que os próprios filhos enterravam os pais, bu... Odeio ver dor alheia, estalo os dedos, dou-lhes folga, bato cabeça no meu túmulo, acendo a quinta vela. Última preguiça: durmo em paz.

Black Sabbath: feriado (esqueci de dizer que o cemitério é israelita). Me acordo com um espelho na frente do meu corpo, nu - dormi no motel Gurgel -, sem bom-dia nem maiores explicações, a taróloga veste roupão preto e vai pagar o pernoite. De madrugada invado o cemitério, me desenterro por completo - roupas úmidas e sujas porém ainda usáveis, coturnos e insígnias idem, dente de ouro, punhal de prata, levei tudo comigo... Será que o Paulo Coelho estava certo? Lá vou eu sei lá pra onde. No motel a taróloga diz que não é mais preciso esperar 40 anos com frio no osso pra vida ser artisticamente feliz... Último desmoronamento.

7° dia: eis a verdadeira felicidade: ela mora em nós mesmos. A patroa me põe de castigo pelo fato de eu ter pego no sono, perfeito; sonhar com cemitério é de bom auspício: me demito. É tão estranho, meu fêmur, meu crânio, meu trapézio, meu nome...
Acompanhamento fúnebre comove o vilarejo.
De repente caio em velha estrutura de queda. A morte nada mais é do que sono rápido em sonho eterno. Sinto minha carne, minha pele sem mosquitos. Portas, chaves, e tesouros redescobertos. No meu monólogo mudo e escuro guardo segredo do passado e do futuro: vivo o presente. Oh! Tétrico ambiente, você esconde verdadeira luz. A taróloga diz Vá, ragazzo innamorato, vá!
Último suspiro.

10 maio, 2008

(sub-sessão: rock decadente)

.
“Erguer o troféu”

Sou a droga
Que te deixa em coma
Essa tragédia
É o mecanismo de força
Você é produto vendido
As crianças aplaudem
Uma nova jogada
Que os melhores guardem
Nós vencemos
Mas não vamos erguer o troféu
Tenha certeza
Vá se alimentar
Vá se destruir
Vá receber sua sentença
A arte de perder
Não é nenhum mistério
Plantar penas e colher espinhos
Não é preciso se desculpar
Só porque você está ficando velho
Você sobe ao mais alto patamar
Para se render
Para se rebelar
Para nunca evitar
Nós vencemos
Mas não vamos erguer o troféu
Você jogou toda lenha
No fogo que nunca aquece
O sonho criou rampas
Sua lágrimas caem como confetes
.
.
serious 2:
carro requer manutenção, não tem jeito. faça uma regulagem periódica, sempre que possível. troque o óleo nos prazos indicados pelo fabricante, verifique filtros de óleo e de ar. Todas essas medidas economizam combustível e ajudam a despejar menos co2 no ar.


♠ Copyanarco 2000 by Andróide

voando parado

.
desde que vivos, claros
Entraram no mercado
Os anos 2000

Passaram voando
meu amor, a denúncia
Da natureza

falando com o vento
Na popular
olhando pro nada

Na executiva
jovens devem sentir ódio
velhos devem voar








pai e filho

arroz feijão
já dá pra ver
na esquina do hipermercado
na TV
Lula na TV

abismos
com sabonete de musgos
caindo

uma estrela de alumínio
sazão de alcance interior

verdejante
defasagem dos pés
macios
fechados e limpos